Jornal Crítica Espírita #46

Crítica Espírita n45 Outubro de 2018O momento sociopolítico atual expôs as feridas abertas e as idiossincrasias do movimento espírita brasileiro. Imersos numa onda de recrudescimento da intolerância política, com tanta tecnologia disponível para a guerra de informações e muitos interesses corporativos em jogo, estamos sendo tragados para mais uma perigosa e imprevisível dinâmica de enfrentamentos.

Não nos cabe, aqui, discutir esse fenômeno, que está sendo fartamente tratado nas mídias, principalmente as internacionais. O nosso intento é compreender como parcela considerável dos espíritas apoia posturas, falas e pessoas que defendem pautas anticivilizatórias.

Ao longo de nossas edições, temos percebido os sintomas desse tempo no meio espírita. Basta dizer coisas óbvias – que ninguém deve passar fome, que as mulheres ainda têm uma luta por respeito e dignidade, ou que direitos humanos é um tema importante – para que surjam pessoas contrárias a isso, em nossa página no Facebook, alegando que é comunismo, coisa de esquerda, e coisas do tipo. Dizem que somos espíritos de porco, infiltrados, obsidiados, irresponsáveis, defensores do aborto, de corruptos, que devemos estudar Kardec, que isso, que aquilo.

Acredito que, pela primeira vez, uma mídia espírita fez entrevista com candidatos à Presidência da República. Não foram todos, seja pelo trabalho que isso gera, seja porque as propostas de alguns candidatos não nos pareciam merecedoras de crédito. Mas não faltaram aqueles que, esquecendo-se que esse jornal é um projeto voluntário, vieram nos xingar de hipócritas, “obnubilados pela esquerda”, por não termos entrevistado candidatos “de direita”, que criticamos Bolsonaro, que é “a favor da família e da vida”, e deixarmos o PT de lado, e que não podemos influenciar o livre arbítrio das pessoas.

A verdade é que, por meio do livre arbítrio, a defesa do mal saiu dos esgotos, do submundo da vida privada, e agora se mostra despudoradamente em público. Destila-se livremente o ódio, com ódio. E no Brasil, uma sociedade ainda estruturalmente patriarcal e escravocrata, temos ódio de sobra e reflexão de menos. E já estão surgindo as primeiras vítimas de um cenário de horror que promete o pior.

Como uma doutrina filosófica, o espiritismo não está imune ao contexto cultural que o abriga, onde é repensado a partir dos horizontes que caracterizam determinada sociedade. Para a nossa, resta compreender o espiritismo a partir das lentes ideológicas e práticas do capitalismo, da competição, da moral individualista e do consumo, quando as categorias espíritas – espírito, alma, reencarnação, causa e efeito, leis morais, fraternidade, caridade, etc. – entram na lógica do capital, do lucro e da circulação de mercadorias, restando uma verdadeira e corajosa teoria e prática da moral e dos afetos fora das cogitações espíritas.

Para ajudar a refletir sobre o que estamos passando, nesta edição contamos com a participação de Felipe Sellin, sociólogo e coeditor do Jornal Crítica espírita, de Sinuê Neckel Miguel, doutor em Ciências Sociais, e de Eric Luiz de Macedo, advogado, todos trazendo apontamentos, luzes, inquietações e questionamentos sobre isso tudo que estamos vivendo no plano político e suas repercussões em nossa vida cotidiana.

Talvez as futuras gerações (espíritas ou não) tenham dificuldade em entender este tempo. O que estamos tendo é uma aula prática de fascismo – de como pessoas comuns são facilmente seduzidas pelo ódio e pela intolerância –, e vendo que nem mesmo um golpe militar é necessário para implantar uma ditadura quando a maioria da população a deseja pela própria via da democracia.

Tenham uma excelente leitura!!

Os editores

Crítica Espírita n45 Outubro de 2018_v02

 

 

Publicado por Jornal Crítica Espirita

O Jornal Crítica Espírita visa realizar uma leitura crítica da sociedade e do pensamento humano, pelas lentes do espiritismo, e do próprio espiritismo, pelas lentes da sociedade e do pensamento humano. Contato: criticaespirita@gmail.com

Se junte à conversa

1 comentário

Deixe um comentário